domingo, 30 de novembro de 2014



A novela de  Pasadena.

*O presente artigo foi editado do seminário proferido por Felipe Gontijo,  mestrando em Direito Empresarial pela Faculdade Milton Campos e advogado da banca JULIANA E FERNANDO GONTIJO, e tem como objetivo detalhar pontualmente todos acontecimentos envolvidos na aquisição da refinaria de Pasadena pela Petrobrás.

   Era uma vez a Pasadena Refining System Inc. (PRSI), unidade de refino de petróleo com sede na cidade de Pasadena, estado do Texas, posição comercial estratégica no Houston Ship Channel, uma das vias navegáveis mais importantes dos Estados Unidos, situado no aberto para o Golfo do México, onde ficam os principais poços de petróleo em operação nos EUA,  com ligações para todo o país.
 
   Estima-se que sua capacidade de refino seja entre 100 e 120 mil barris diários, lembrando de antemão que a descoberta de indícios de petróleo no pré-sal se deu em dezembro de 2006.
   Em 1998 a PRSI foi multada em 1,1 milhões de dólares por ter nível de poluição atmosférica acima do aceitável.Segundo um artigo do Oil Daily, a Crown Central (antigo nome da PRSI) havia registrado prejuízo de 829,4 milhões de dólares naquele ano.
 
   Além disso, com muitos processos trabalhistas, existia a época uma intensa campanha contra a companhia, coordenada pelo sindicato de petroleiros local, que defendia um boicote à gasolina vendida em seus postos.
 
   Nesse contexto, o mercado não confiava na administração de Henry Rosenberg, o então controlador, e suspeitava que ele estaria preparando a venda da empresa.
 
   Segundo um artigo do Baltimore Sun, de 2003, construir uma nova refinaria igual à PRSI custaria mais de 1bilhão de dólares, mas segundo os livros contábeis da Crown, ela estaria avaliada em apenas 270 milhões de dólares.
 
   Em contrapartida, os operadores do mercado acreditavam que Rosenberg teria sorte se conseguisse vendê-la por mais de cem milhões.
 
   Não foi uma venda fácil. Após alguns anos, em janeiro de 2005, a PRSI acabou sendo comprada pela Astra Holding USA, subsidiária da Astra Oil, que por sua vez é controlada pela Transcor Astra Group, ao preço de venda de 42,5 milhões de dólares.
 
   Em 23 de fevereiro de 2005, o Sr. Alberto Feilhaber, ex-funcionário da Petrobras, na qualidade de representante da Astra Oil Company, solicitou, por ofício, uma reunião com a multinacional brasileira para discutir possível parceria para operar a usina de Pasadena.
   Em 31 de março 2005, representantes da Petrobras visitaram as instalações da refinaria.
 
    Os relatórios da visita demonstraram aspectos positivos, mas recomendaram due diligence com assessoria especializada, apontando desconfianças quanto a viabilidade do negócio.
 
    Em 4 de maio 2005, a Astra fixou com a Petrobras o Memorando de entendimentos com termos e condições gerais de uma potencial aquisição das ações da PRSI, por parte da Petrobras America Inc. (PAI).
 
   Em primeiro de julho de 2005, a assessoria Muse Stancil & Co. apresentou relatório de due diligence de avaliação da refinaria.
 
   Em 18 de agosto de 2005, a Diretoria Executiva da Petrobras autorizou a apresentação de oferta à Astra para a compra de 70% das ações da PRSI ou dos ativos, por 365 milhões de dólares.
 
   Em setembro seguinte, a Astra apresentou contraproposta à Petrobras para negociação de 70% da participação por 475 milhões, ou 60% a 407 milhões.
 
   No dia 29 daquele mês, a Diretoria Executiva da Petrobras aceitou a contraproposta oferecida, mas a negociação não parou!
 
   Em 02 de fevereiro de 2006, após nova rodada de negociações, em que a Astra exigiu participação igualitária no capital social, a compra foi aprovada pela Diretoria Executiva da Petrobras.
 
   O Conselho de Administração da Petrobras autorizou a aquisição pela PAI de 50% das ações da PRSI, quem detinha os ativos da refinaria, e 50% da PRSI Trading Company (PRSITC), que seria criada e deteria os direitos de comercialização dos produtos.

Valores efetivamente pagos pela  Petrobras America Inc à Astra, conforme auditoria

   Em Maio de 2006, um adiantamento do preço de US$30 milhões. Em Agosto de 2006, o preço, com reajustes, no total de US$285 milhões. Em Fevereiro de 2007, 1ª parcela da alocação especial (PRSITC), US$85 milhões. Em Fevereiro de 2008, 2ª parcela da alocação especial (PRSITC), US$85 milhões. Total: US$485 milhões.
   Contudo, como US$ 54 milhões foram incorporados à PRSITC, ao todo foram pagos US$431 milhões pela primeira parte do negócio.

Termos gerais acordados

   Foi assegurado à PAI o direito  de impor decisões em caso de empate nas votações; previsão de diluição da participação da Astra, caso optasse por não aportar recursos necessários à implementação do projeto de expansão e garantia pela Petrobras de retorno mínimo à Astra de 6,9% ao ano, durante 15 anos, caso fosse implementado o projeto de expansão.
 
   Estipulou-se ainda cláusula de put option, que conferiam à Astra a prerrogativa de extinguir a parceria, quando bem entendesse, e de exigir a aquisição de suas ações pela PAI, por preços que variavam entre 6% e 20% acima do valor de mercado, a ser oportunamente calculado conforme fórmulas estabelecidas.

Compra pela Petrobras America Inc do restante das ações.

   No final de 2007, após problemas na governança da PRSI e da PRSITC, as sócias iniciaram negociações para a aquisição pela PAI do restante das ações das sociedades.
   Em 5/12/2007, Astra e Petrobras celebraram a Carta de Intenções estabelecendo a futura compra e venda de 50% da PRSI por 700 milhões de dólares e de 50% da PRSITC, por 87 milhões. A Petrobras foi representada por Nestor Cuñat Ceveró, na qualidade de Diretor da Área Internacional.
 
   Estes valores foram obtidos pela atualização da valoração econômica da refinaria, considerando-se 100% de participação. Foi observado que o Valor Presente Líquido (VPL), com investimentos efetuados da ordem de US$ 350 milhões, atingiu a quantia US$1,28 Bilhões. O que justificaria a diferença de valor entre os 50% iniciais e a proposta de aquisição do restante.
 
   Mesmo sem prévia realização de estudo comparativo do valor a ser ofertado com aquele que resultaria da direta aplicação das cláusulas contratuais, a compra e foi aprovada pela Diretoria Executiva da Petrobras.
 
   Só em 3/3/2008 o assunto foi submetido à consideração do Conselho de Administração da Petrobras, que exigiu informações complementares para a concretização do negócio.
 
   A matéria foi novamente submetida ao Conselho de Administração em 8/5/2008, mas, conforme ata do dia 12/5/2008, transferiu a decisão para a reunião seguinte.
 
   Em 19/6/2008, a PAI convocou uma reunião do Superboard da PRSI para aprovar ações com vistas a garantir sua saúde financeira.
 
   Na mesma data, a Petrobras deu início a processo de arbitragem contra as sociedades do grupo Astra, alegando descumprimento das seguintes cláusulas contratuais: 1) gestão conjunta das empresas, 2) chamada de capital e 3) implementação do plano de negócios e Segurança, Meio Ambiente e Saúde.
 
   A Petrobras requereu, ainda, que os árbitros declarassem que a carta de intenções, firmada em 5/12/2007, não seria vinculante e não teria o condão de eliminar as obrigações da Astra.
 
   Em contrapartida, em 1/7/2008 a Astra exerceu sua opção de venda (put option), que obrigaria a Petrobras a adquirir sua participação acionária nas empresas, conforme fórmulas.
 
   Ainda em 1/7/2008, a Astra ingressou com ação nos Estados Unidos, sob o fundamento de que a Petrobras teria descumprido compromissos assumidos na Carta de Intenções, pedindo o pagamento de US$788 milhões, acrescidos de juros e honorários advocatícios.
 
   Em 1/12/2008, a Petrobras assumiu a gestão operacional da PRSI.
 
   Em 3/12/2008, a Astra ingressou com ação em face da PRSITC, buscando ser ressarcida em valores pagos ao banco BNP Paribas, no valor de US$156 milhões.
 
   A sentença arbitral foi proferida em 10/4/2009, condenando a PAI ao pagamento de US$ 639 milhões, sendo: US$ 295 milhões para compra dos 50% remanescentes da PRSI, acrescidos de US$ 8 milhões de juros sobre esse montante; US$156 milhões de indenização (empréstimo da Trading junto ao Paribas), US$ 3 milhões de juros; US$170 milhões referentes a compra dos 50% remanescentes da PRSITC somados a mais US$ 4 milhões  de juros desta parcela.
 
   Em 16/4/2009, o Secretário-Geral da Petrobras levou ao conhecimento do colegiado de diretores o resultado da arbitragem, sendo que o Gerente Executivo da Petrobras, Samir Passos Awad, propôs postergar o cumprimento da decisão arbitral para após a solução das seguintes pendências técnicas por ele elencadas:
 
         1. A indenização devida em razão do pagamento pela Astra ao Paribas ainda estava sendo discutida judicialmente. Assim, a sentença arbitral deveria vincular o pagamento à extinção da ação, a fim de evitar o “double recovery”.

                2. Deveria haver garantias de que a Astra efetivamente transferiria suas ações à PAI, bem como que a Astra deveria garantir que as ações ainda eram de sua titularidade.
 
   Na data fixada pela sentença, a Astra transferiu a totalidade de suas ações na PRSI e na PRSITC à PAI, mas a Petrobras não efetuou o pagamento diante da alegada insegurança jurídica.
 
   Somente em 30/7/2009, o Conselho de Administração da Petrobras tomou conhecimento da estratégia de dar prosseguimento aos processos em curso e concordou com o condicionamento do cumprimento da decisão arbitral a determinação judicial ou à assinatura de termo de acordo com quitação plena quanto à questão de Pasadena.
 
   Em Out/2011, as partes iniciaram conversas para celebrar um acordo extrajudicial que terminaria com todas as disputas relativas à PRSI e PRSITC.
 
   Os litígios existentes poderiam chegar a US$1,2 bilhões!
 
   Em 7/5/2012 as partes chegaram a um acordo, que totalizou US$ 820 milhões, com US$342 milhões para compra dos 50% remanescentes na PRSI, sendo US$ 46 milhões de juros e US$ 478 milhões para encerramento das demais disputas.
 
   Com isso, liquidaram todas as disputas judiciais, reclamações e causas, de qualquer tipo, conhecidas e desconhecidas, que as partes tinham ou poderiam vir a ter.
 
   O acordo foi aprovado pelo Conselho de Administração da Petrobras em 13/6/2012.
 
  Dessa forma, o total pago pela Petrobras à Astra pelas ações da PRSI e PRSITC foi de US$1.245.697.714,30, considerando a primeira parte do negócio e o acordo, montante resultante das seguintes quantias:
 
   189 milhões a preço contratual por 50% da PRSI em 2006; 85 milhões a título de alocação especial referente à 50% da PRSITC, em 2007; 85 milhões a título de alocação especial referente à 50% da PRSITC, em 2008; 66 milhões de ajuste de preço conforme cláusula contratual, 342 milhões pelos 50% da PRSI em 2012 e 478 milhões para o encerramento das demais disputas, fechando a soma no em um bilhão duzentos e quarenta e cinco milhões seiscentos e noventa e sete mil setecentos e quatorze reais e trinta centavos.

Do Acórdão do Tribunal de Contas da União

   Trata-se de representação oferecida pelo Procurador do Ministério Público, Marinus Eduardo De Vries Marsico, visando à apuração de suposto dano aos cofres públicos, gestão temerária e ato de gestão antieconômico no processo de aquisição da PRSI e PRSITC pela PAI.
 
   O Relator do Acórdão do TCU é José Jorge de Vasconcelos Lima, que foi Deputado Federal entre 1983 e 1999, Senador por Pernambuco entre 1999 e 2007 e  candidato à vice-presidência na chapa de Geraldo Alckmin em 2006.
   Foi indicado pelo Senado a Ministro do TCU em dezembro 2008, vencendo por 41 votos a 34 o Senador Leomar Quintanilha, em votação secreta. Foi empossado em 3 de fevereiro de 2009.
 
   Por determinação do TCU, foi realizada inspeção na Petrobras, por equipe técnica, que apresentou Relatório de Fiscalização, que concluiu o seguinte:
 
1) A decisão de adquirir a Refinaria de Pasadena foi tomada sem que houvesse avaliação de outras oportunidades de investimento em refinarias.
 
2) A divisão de riscos e oportunidades, fixada no contrato e no acordo de acionistas não foi devidamente contemplada na avaliação do negócio.
 
3) Os atos de gestão levados a efeito pelos administradores da Petrobras, desde o início do impasse societário até a solução dos conflitos com o acordo extrajudicial, geraram um ônus financeiro excessivo à Petrobras.

Da metodologia de cálculo do prejuízo incorrido pela Petrobrás

   Considerando a premissa do pronunciamento da Unidade Técnica, a compra da PRSI e PRSITC pela PAI foram analisadas como um todo, posto que o desmembramento da PRSI em PRSITC não alterou a essência o empreendimento.
 
   A avaliação da consultora Muse & Stancil, empresa texana especialista em questão de refino de petróleo, utilizou o método do fluxo de caixa descontado, ou seja, a capacidade de gerar fluxos de caixa positivos ao longo do tempo.
 
   A contribuição relativa de cada ativo para geração de caixa da empresa estava embutida no modelo.
 
Síntese das avaliações da Refinaria

   Segundo a Muse & Stancil, a partir de uma taxa de desconto de 12%, o valor de mercado da refinaria, no estado em que se encontrava em 1º de janeiro de 2006, seria de US$126 milhões, podendo variar para um piso de US$ 84 milhões (desconto de 14%) ao teto de US$ 186 milhões (taxa de 10%).
 
   A Petrobras, por sua vez, elaborou Estudo de Viabilidade Técnica e Econômica – EVTE, que apurou, como estimativa de preço para o negócio, o valor de US$ 745 milhões.
 
   O EVTE considerou como pressuposto a realização de investimentos para a adaptação e expansão das instalações de refino, que viabilizariam o processamento do petróleo pesado extraído de Marlim.
 
   Essa pretensão era a finalidade principal da aquisição da refinaria.

Do EVTE da Petrobras

   O EVTE fez a avaliação com base no pressuposto de que os fluxos de caixa estimados seriam aqueles obtidos pela refinaria, APÓS A REALIZAÇÃO DE VULTOSOS INVESTIMENTOS (Revamp) que seriam feitos pela própria Petrobras.
 
   Ou seja, em vez de estimar o preço considerando o estado em que a unidade se encontrava, o EVTE calculou o fluxo de caixa após a realização do Revamp.
 
   Mesmo assim, a contra senso, o contrato de compra e venda e o acordo de acionistas conferiam à Astra a prerrogativa unilateral de não efetuar tais investimentos, podendo, ainda, exercer o put option, por valores acima do preço de mercado da companhia.
 
   Mais, não bastasse a premissa viciada, a Petrobras assumiu outros pressupostos que se revelaram irreais e prejudiciais a ela:
 
1) margens de refino projetadas acima das de mercado;
 
2) previsão de incremento de receita bruta em data antes da realista;
 
3) pretensão de refinar, desde o início da operação, óleos crus de Marlim, a despeito de a consultora Muse & Stancil advertir sobre a necessidade de testes para sucesso da oferta de compra vinculante;
4) projeção improvável para início de refino de diesel a ultrabaixos teores de enxofre, considerando o tempo que as reformas necessárias para tanto demorariam;
 
5) deságio muito inferior ao de mercado para o preço de venda do petróleo de Marlim;
 
6) taxa de desconto assumida de 6,9% a.a., incompatível com o risco de operação. Inclusive, A Petrobras se obrigou a garantir à Astra uma rentabilidade mínima de 6,9% a.a., após impostos, para todo o empreendimento. Precisa, portanto, a conclusão de que ela concordou em absorver para si todo o risco do negócio;
 
7) estimativa subestimada da necessidade de investimentos para o Revamp, (519 milhões  x 1 bilhão projetados pela Muse & Stancil).
 
   Com base nisso, o relator do TCU conclui que o EVTE não foi falho ou inconsistente. Ele teve “clara intenção de majorar a estimativa de preço da Refinaria”.
 
   Desde o primeiro momento da operação, compradora e vendedora atuaram alinhadas buscando objetivo comum: o maior preço possível.
 
   O EVTE da Petrobras, concluído em US$ 745 milhões, balizou efetivamente o preço acordado para a compra e venda. O valor para a primeira metade foi cerca de US$359,3 milhões, montante quase idêntico ao estimado pelo EVTE.
 
   Lembra, ainda, que após ajustes, a participação inicial foi adquirida por US$431 milhões, quantia superior a própria avaliação pelo EVTE, como apurado pela auditoria.

Da avaliação da Muse & Stancil

   A Muse & Stancil promoveu o due diligence, apurando, em pormenores a real situação da PRSI sob os aspectos técnico, operacional e comercial.
   Registrou, ainda o preço pelo qual a Astra havia adquirido junto à Crown, em janeiro de 2005, e que a PRSI demandava investimentos para viabilizar a produção de gasolina e diesel dentro das exigências ambientais dos EUA.
 
   Com base nisso, valor de mercado da refinaria, no estado em que se encontrava em julho de 2005, utilizou a taxa de desconto de 12% ao ano, no centro do intervalo de 10% a 14% a.a., que era considerado plausível ante os riscos associados ao empreendimento.
 
   O Relator considerou o valor superior do intervalo apurado pela Muse & Stancil como adequado para o valor de mercado da PRSI. Assim, tomando por base a taxa de desconto de 10% a.a., ele atribuiu como valor de mercado da PRSI, em julho de 2005, a quantia de US$ 186 milhões.

Do desequilíbrio contratual

   A análise das cláusulas conduzem à conclusão de que os contratos impuseram desigual distribuição de riscos e benefícios para as sócias, favorecendo, de forma excessiva, a Astra em detrimento da Petrobras.
 
1) Put Option: estipulou fórmula que previa acréscimo ao preço de venda da participação da Astra de 6% a 20%, dependendo das circunstâncias.
 
2) Não foi explicitada a obrigação da Astra arcar com os investimentos necessários para adaptar a refinaria para o processamento do óleo pesado de Marlim (Revamp), nem havia compensação caso ela saísse do empreendimento antes do aporte dos recursos.
 
3) Foi garantida pela Petrobras à Astra rentabilidade mínima para o empreendimento conjunto de 6,9% a.a., durante 15 anos. Ou seja, a Petrobras assumiu todos os riscos do negócio, uma vez que havia se utilizado de taxa de desconto idêntica ao estimar o valor da refinaria em seu EVTE.
 
4) Foi assegurada a Astra a “alocação especial”, além do pagamento pelos estoques existentes em 1/9/2006, independentemente do resultado da PRSITC, constituindo bis in idem.

Dos prejuízos à Petrobras decorrentes dos arranjos contratuais.

   O Ministro Relator concluiu pela existência de robustos indícios da prática de atos que impuseram prejuízos à Petrobras em razão da compra de 50% da PRSI e da PRSITC, bem como do exercício do put option pela Astra, no total de US$580 milhões.
 
   US$266 milhões decorrentes da compra por US$359 milhões de 50% PRSI e da PRSITC, sendo que avaliados em US$93 milhões pela Muse & Stancil.
 
   US$314 milhões decorrentes o exercício do put option por US$407 milhões, sendo que avaliados em US$93milhões pela Muse & Stancil.

Da responsabilização de agentes pelos danos.

   O Relator entende que, por certo, o Gerente Executivo de Desenvolvimento de Negócios e o Gerente Jurídico internacional da Petrobras, além do CFO e o presidente da PAI, participaram da concepção dos negócios.
 
   Cabia aos membros da Diretoria Executiva da Petrobras a gestão do processo da compra, desde o contato inicial até a confecção dos contratos, portanto também podem ser responsabilizados.
   A aquisição de empresas é, por natureza, atividade que envolve riscos, mas no caso concreto não se pode falar apenas de mau negócio para minimizar o grau de culpa dos agentes envolvidos.
 
   Há pressupostos flagrantes de que detinham, ou deveriam deter (gross negligence), conhecimento sobre as operações para se contraporem à aquisição da PRSI nas condições em que se deu.
 
  Contudo, foi comprovado que os relatórios apresentados aos membros do Conselho de Administração deixaram de mencionar a cláusula de garantida de rentabilidade à Astra e as condições para o exercício do put option.
 
   Os referidos documentos, omitiram, ainda, as informações do estudo da Muse & Stancil que avaliou a refinaria em US$126 milhões, fornecendo informações imprecisas quanto ao Revamp e o processamento de petróleo de Marlim.
 
   Por isso, conclui o Ministro. que o vínculo de causalidade entre a autorização de aquisição pelo Conselho de Administração e essa parcela do dano é muito tênue, não podendo seus membros serem responsabilizados, já que suas decisões foram baseadas nas premissas apresentadas pelo Diretor da Área Internacional e pelo Gerente de Inteligência de Mercados da Unidade Internacional e Desenvolvimento de Negócios.

A regra do julgamento do negócio

   Business judgment rule é a forma de proteção de responsabilidade dos administradores (diretores e membros do conselho de administração) pelas decisões tomadas em cumprimento de seus deveres fiduciários para com a sociedade e seus acionistas.
 
  Pela regra, presume-se que os administradores, desinteressados e independentes, atuaram devidamente informados, de boa-fé, em prol dos interesses da companhia e de seus acionistas quando tomaram as decisões negociais.
 
  Assim, ainda que o empreendimento autorizado pelos administradores cause prejuízos à companhia, o risco é considerado inerente ao negócio, e eles não poderão ser responsabilizados pelos danos.
 
   Seguindo tais premissas, o relator conclui que apenas a assinatura da carta de intenções causou à Petrobras um prejuízo de US$79 milhões.
 
   Ele responsabiliza por este prejuízo o então Diretor da Área Internacional da Petrobras, Sr. Nestor Cuñat Cerveró, quem conduziu as negociações, e o ex-presidente da companhia, Sr. José Sérgio Gabrielli, que, segundo informações da Astra e do Sr. Auditor, teria autorizado o negócio.

Descumprimento da sentença arbitral

  Como já dito, a Petrobras optou por questionar judicialmente, com base possíveis vícios procedimentais, a validade da sentença arbitral que a condenou ao pagamento de US$468 milhões, com juros compostos de 5% a.a. em hipótese de mora.
 
   Considerando que a Petrobras aderiu voluntariamente à cláusula compromissória, que a deflagração da arbitragem ocorreu por iniciativa dela e, ainda, a natureza vinculante da arbitragem, o relator entende que o questionamento judicial da validade da sentença arbitral causou prejuízo à Petrobras, já que, para tanto, ela acabou arcando com o pagamento juros elevados.
 
Aguardemos as cenas dos próximos capítulos, desta que é a novela mais cara do Brasil. 


terça-feira, 11 de novembro de 2014


Direita esquerdista ou esquerda centralizada?

     Fazia tempo que não se via, com tamanho radicalismo, a divergência das opiniões tidas como certas e erradas sobre quem deve governar o nosso pais.

     Divididos em dois polos opostos, de um lado estão os ferrenhos defensores do fortalecimento da economia e da prioridade da livre concorrência, representados em sua maioria pelos seguidores do PSDB, e do outro, os que ferozmente pregam por uma sociedade mais  igualitária, com maior distribuição da renda, ainda que as custas dos mais abonados, abandeirados pelo PT.

     Contudo, será que os dois partidos protagonistas da atual disputa pelas rédeas do poder, são tão heterógenos quanto se prega por aí? Seria realmente impossível a mistura da “turma dos coxinhas”  com a “galera comunista”?

     Para que não se confunda a intenção de respostas  com o apego ou defesa de qualquer uma das “agremiações”, comecemos o raciocínio com a abordagem histórica e ideológica das duas partes, para só ao final apontar a conclusão clara...ou não!

     A grosso modo, temos a seguinte linha de evolução do nosso sistema político: Absolutismo, Liberalismo Econômico, Socialismo e o atual, carinhosamente batizado de Estado Democrático de Direito. Por determinado período, de forma sequencial, cada um desses modelos foram adotados.

     Começa na idade média com o Absolutismo, onde se tinha a totalidade do poder na mão do Estado, entidade soberana que podia tudo e um pouco mais. Com a revolta da classe burguesa, que trabalhava bastante e ficava com as migalhas, se estabeleceu o Liberalismo, onde vigorava os ideais capitalistas na velocidade cinco do créu,  aplicando o cada um por si e Deus por todos, chegando-se a máxima da acumulação de riqueza e desigualdade das classes.

     O que não foi bem aceito para aqueles que não tinham acesso ao recheio do bolo, e, cansados de ficarem apenas com as raspas, impuseram o Socialismo, no qual o Estado voltava a intervir de forma direta em todos os ramos da sociedade,  impondo a divisão igualitária de riquezas, com a implantação do comunismo, devendo se viver no mesmo padrão de igualdade.

     Qual deles deu certo?

     Para a maioria, nenhum, senão não estaríamos sujeitos ao Estado Democrático de Direito. Neste, temos uma mistura dos outros antecedentes, na justificativa de que se aplicaria o melhor de cada.

     O resultado é um Estado como ente maior e soberano, que entretanto, respeita as vontades do indivíduo e prioriza o bem estar da sociedade, só intervindo quando a vontade individual ultrapassa os interesses da coletividade.

     Seria como um pai, que deixa seus filhos viverem da forma que melhor lhes convir, desde que respeitem os princípios da família, sob pena de ficarem de castigo ou  entrar na correia, pois apesar da liberdade, quem manda é o papai.

    Agora sim, traçadas figurativamente as doutrinas que dominaram as diretrizes político-econômicas-sociais, voltemos aos dois partidos “brigões”.

      Dentro dos meus ouvidos ecoam o soneto de que a principal diferença entre   PT e  PSDB é por aquele ser o representante da esquerda, e ainda que estejamos no atual Estado Democrático, tem em suas raízes ideológicas os ideais socialistas, enquanto que o outro, notório partido de direita, carrega na bagagem a luta pelo liberalismo econômico defendido pela burguesia de outrora.

     Seria simples assim, sendo o PT a esquerda socialista e o PSDB, a direita conservadora liberal, opostos como lá e cá, preto e o branco, longe e perto, norte e o sul.

      Porém, não seria essa a absoluta verdade, nem para um e nem para o outro.

    Vale lembrar que o Partido Social Democrata Brasileiro, tem como fundador e maior expoente,  um  sociólogo de  formação, que por longo período da sua juventude, dedicou seus estudos as obras e teorias de Karl Marx.

      Ou seja, o ex presidente Fernando Henrique Cardoso já foi simpatizante do  filósofo tido como pai do socialismo e pregador do comunismo “inevitável”, mártir seguido ainda hoje por uma boa parte dos membros do PT, principalmente pela ala mais radical.

      Talvez por isso, na época que se criou o PSDB, se tinha no grupo, motivado pela discordância das medidas do presidente Sarney, vários militantes da esquerda anti-militarista, e por consenso se optou pela ideologia social-democrática.

     Ideologia que tem em seu bojo a busca pela redução da pobreza e desigualdades, adotando-se o capitalismo como regente da economia, gerando recursos para que o Estado aplique o socialismo, mediante a tributação.

     O pensamento é de que deve ser concedida a iniciativa privada estímulos para produzir, e por conta própria gerar riquezas, que  seriam em parte passadas ao Estado, através dos tributos, que por sua vez, direcionaria tal montante aos menos favorecidos, por programas e medidas sociais.

     Se deixa produzir com o mínimo de interferência, mas tem que dar parte da marmita para que o Estado redistribua como os demais. Este é a base ideológica do PSDB, que então, jogaria por terra a alcunha de partido de direita, o reposicionando quem sabe como uma “esquerda flexível”, ou “esquerda capitalista”, ou “centro-esquerda” ou “centro-direita”, ou  do que quiserem, menos de direita radical, onde o Estado apenas assiste as vontades econômicas individuais, sem maior participação.

    Já o Partido dos Trabalhadores, conforme o nome, estaria voltado para os interesses do proletariado, tendo como fundadores operários sindicalistas e intelectuais marxistas, assumindo a postura socialista pura.

     O principal mantra seria dividir o todo para todos, ou pelo menos foi isso que se pregou em seus primórdios, seguindo caminho curvilíneo, diante a política econômica adotada já no início do governo de Luís Inácio.

     Basta citar o nome do Sr. Hernrique de Campos Meirelles, excelente expert em finanças, escolhido como Presidente do Banco Central do Brasil por Lula, que havia sido eleito na véspera como o Deputado Federal mais votado no estado de Goiás, pelo PSDB, diga-se de passagem.

     Capitalista nato, também foi ex-presidente do Bank of Boston, CEO do FleetBoston Financial, Presidente da Associação Brasileira das Empresas de Leasing; Membro da Câmara Americana do Comércio, Diretor executivo da FEBRABAN (Federação Brasileira de Bancos), dentre outros postos que certamente arrepiaria a felpuda e vasta barba de Karl Marx.

     Henrique Meireles teve papel direto na boa condução da economia durante o governo petista e é o  atual recordista que por mais tempo permaneceu na presidência da instituição, de 2003 a 2011, dada a sua brilhante desenvoltura nas funções assumidas.

     E, para aqueles que mencionei no início do texto, que persistem em dizer que  PT e PSDB não se misturam, lamento informar que além das semelhanças apontadas, chegaram ao ponto de fazerem parte da mesma chapa de coligação no segundo turno  da campanhas de 1989, com o apoio expresso do PSDB a candidatura de Lula, e mais tarde novamente juntos, pelo impeachment do ex presidente Fernando Collor de Melo.

     Os “tucanos” e os “estrelas vermelha” mantiveram o namoro até meados do ano de 1994, quando haviam informalmente acertado a candidatura de Tasso Jereissati, PSDbista, como vice de Lula para o próximo pleito

     Entretanto, em razão do sucesso do Plano Real, o partido azul mudou de ideia  e decidiu encabeçar a própria candidatura com FHC, rompendo-se assim a linda história de amor, e iniciando a já conhecida fase de recalque dos pombinhos enamorados.

    No fim das contas, digamos que as duas legendas são diferentemente iguais. Pregam ideologias distintas, mas praticam, a mesma política econômica, mudando apenas o foco de incidência dos recursos apurados.

   Priorizando consertar a economia e colocar o Brasil no cenário desenvolvimentista mundial, o PSDB optou por medidas estruturais e generalizadas, deixando um buraco no campo social que carecia de amparo imediato.

   Esse buraco foi inteligentemente ocupado pelo PT, que levou a aqueles que ficaram “desamparados” o mínimo para o sustento, mediante medidas conjunturais de assistencialismo.

     Portanto, é inegável, ainda que em doses homeopáticas, a existência do socialismo nas veias dos sociais- democratas de puro sangue. Da mesma forma que também o é a existência da cartilha capitalista no bolso do governo petista.

   O que os xiitas partidários ainda não perceberam é que para que qualquer um dos dois polos se fortaleça, é preciso justamente   reforçar parte do que o outro tem de mais expoente.

   Dificilmente conseguirá o PT se manter no poder caso não amplie a sua política econômica de forma geral,  não se limitando ao assistencialismo  da base da pirâmide, como também não terá sucesso o PSDB de retornar ao trono enquanto não direcionar pontualmente boa parte da sua atenção ao indivíduo que ficou a mercê da pobreza.

  Quanta contradição!