Dicotomia é a divisão de um elemento em duas partes, em geral contrárias, como a noite e o dia, o bem e o mal, o preto e o branco, o céu e o inferno. Com origem no grego dikhotomía, indica uma classificação fundamentada na dualidade entre dois elementos, aqui pautada nas divergências e diversidades das ideias.
domingo, 31 de janeiro de 2016
segunda-feira, 25 de janeiro de 2016
Cenário político versus ideologia – por que a sua omissão irá permitir que seus filhos se tornem “unissex”.
*Texto escrito por Leandro A. P. Silva
Medico psiquiatra
Doutor em Ciências
Embora seja tema que cause desconforto na maior parte das pessoas, a discussão
política não pode mais prescindir do posicionamento das pessoas que “não gostam
de política”, pois os que gostam de política estão passando a decidir vários
aspectos da sua vida, dentro de sua casa, com a sua família. Exemplos como a
“lei da palmada” (quando já havia leis contra o espancamento de crianças,
aliás, contra o espancamento de qualquer ser humano) e a possibilidade de ser
processado, caso seu vizinho tenha entendido de forma particular, algo que você
tenha dito, explicitam como a política já está dentro da sua casa. A política
já determina como você deve se comunicar com outras pessoas, o que pode ser
dito sem o eventual risco de um processo e como você deve educar os seus
filhos. Caso as pessoas comuns persistam alheias ao processo político
ideológico, em algum tempo o avanço sobre as liberdades individuais poderá
avançar a um ponto de decidirem o que você pode ler, escrever, escutar, comer
ou beber.
A política seria o espaço, por
excelência, para a discussão de idéias, troca de opiniões e defesa de
diferentes pontos de vista. A política também é o espaço para a discussão dos
interesses de diferentes grupos.
Ambas as formas de
exercício político são legítimas.
A primeira é ideológica – das idéias,
das proposições teóricas. A segunda
remete aos interesses primários de cada grupo. Existe uma clara hipertrofia da
segunda posição, com uma ampla cobertura do cenário político, em detrimento da discussão
sobre quais parâmetros devem ser adotados para a vida privada, sobre o papel do
Estado (por exemplo, se teria o direito de interferir na educação dada pelos pais),
ou se o governo deve determinar a vida religiosa de cada um.
Talvez por essa hipertrofia da
discussão da política partidária (cenário político), há um desinteresse
generalizado por política. Esse desinteresse acaba por gerar um resultado
óbvio: somente serão aprovadas as idéias dos poucos envolvidos em qualquer
temática, e somente esses grupos serão privilegiados.
As definições de certo e errado, do que é bom ou
ruim, da moralidade e da ética, irão seguir o grupo melhor representado
numericamente. Entretanto, somente um grupo tem se feito representado na política,
seja pelo posicionamento ideológico, seja pela defesa dos seus interesses privados.
Para entendermos melhor qual grupo é esse, temos
que explorar a concepção primária de que cada pessoa tem sobre a natureza
humana.
Podemos estabelecer duas grandes
posições conceituais sobre a natureza humana:
- Alguns acham que o ser humano é bom
por essência.
- Outros acreditam que, embora possa
ser bom, não é uma característica inata, mas sim que deva ser trabalhada.
O primeiro grupo (que acreditam numa
forma de “bondade essencial”) tende a ver as diferenças humanas como
construções sociais, em que os criminosos se tornam criminosos pelas diferenças
sociais, impostas pelo mundo, numa espécie de “falta de sorte”. Afinal, se
todos são iguais e bons, as diferenças só poderiam ser decorrentes das
imposições sociais. Por exemplo, apesar de existirem bandidos em todas as
classes sociais, acreditam que a pobreza é o que causa a violência social.
Curiosamente, esse grupo apresenta extrema dificuldade em analisar os fatos, e
perceber, por exemplo, que a renda per
capita do brasileiro quintuplicou nos últimos 35 anos, enquanto a violência
cresceu 4 vezes! Mesmo ajustando para o crescimento da população brasileira no
mesmo período, o número de homicídios mais do que dobrou. Sendo a violência uma
determinação social, mesmo que
os dados apontem em direção contrária, seria necessária uma mudança social,
talvez até uma revolução, para que a violência regrida. Todo o foco é colocado
na mudança da sociedade, apesar da sociedade (por intermédio dos dados
disponibilizados publicamente) apontar que não é a pobreza que causa a violência.
Que fique claro: não estou aqui simplesmente tecendo uma opinião. Em 1980 foram
registrados 13.910 homicídios no Brasil. Em 2014, foram mais que 52.000. Dados
do Banco Mundial evidenciam uma renda per capita evoluindo de aproximadamente
US$2.000 para mais que US$10.000. Ou seja, aumentou a renda, e a violência.
Naturalmente, alguns irão argumentar que o que aumentou foi a má-distribuição
de renda, em que os pobres ficaram ainda mais pobres, e os ricos ainda mais
ricos. Utilizemos então outros parâmetros, como o IDH (Índice de
Desenvolvimento Humano), que mede a qualidade de vida e o desenvolvimento
econômico de uma nação. O IDH também cresceu no período, indo de 0,549 em 1980,
para 0,744 em 2014.
Dessa forma, a discussão beira a
desonestidade, pois, o argumento que o primeiro grupo utiliza não se sustenta,
nem mesmo segundo as estatísticas. Embora nossa historicidade já tenha dados
suficientes para responder essa questão, poder-se-ia pensar que a discussão
ocorreria por pura ignorância. Mesmo assumindo uma falsa suposição da “bondade
essencial” humana, persistir na ignorância dos fatos (crescimento da renda per capita, do IDH e da violência, ao
mesmo tempo) chega a ser absurdo.
Repetindo, são duas suposições:
1- O ser humano é essencialmente bom, e
a sociedade o corrompe;
2- O ser humano pode ser bom, ou não,
por fatores inerentes à espécie humana.
Repassando, ao se seguir a primeira
suposição, o problema da violência é social. Na resolução desse problema,
parte-se do pressuposto que a violência é oriunda da pobreza. Entretanto, o IDH
e a renda per capita avançaram, mas ainda assim, a sociedade ficou mais
violenta. Só há uma inferência lógica decorrente dessa breve análise: a
violência não é um subproduto da pobreza. O fato desse silogismo ser
contraintuitivo é um fato em si.
Ou seja, o argumento não se sustenta dentro de sua
própria tentativa de coerência teórica, e as
pessoas continuam acreditando nesse argumento!
Trata-se do homicídio da lógica!
Por que o segundo grupo, que pensa
que o ser humano não é essencialmente bom, não exige que o primeiro grupo tenha
um mínimo de coerência lógica? Por que o segundo grupo não se vê representado
politicamente?
Mas talvez seja esse um dos grandes
problemas a serem enfrentados: a falta de lógica, como matriz social.
E por que isso ocorreu? Provavelmente
porque nos interessávamos menos por discussões sociais e políticas, pois éramos
cientes da condição humana, da sua biologia, dos seus limites, e das dificuldades
inerentes à própria vida. Estivemos focados no desenvolvimento pessoal,
reservando à sociedade o fruto final dos nossos esforços, do nosso acúmulo de
conhecimento, do avanço da experiência adquirida. Sabíamos que deveríamos nos
desenvolver e ser responsáveis por nós mesmos, ao invés de responsabilizar o
outro pelas nossas próprias vidas.
O grupo que tende a ver o ser humano
como mera consequência das ações sociais, naturalmente se ocupou mais com o
desenvolvimento da sociedade e, por consequência, da política, em detrimento do
desenvolvimento individual. Embora não sejam tão numerosos na população,
ocuparam mais habilmente os espaços políticos, chegando a tornar o discurso que
vence as eleições quase uma formalidade, sem forma e sem conteúdo.
Infelizmente, erramos ao termos nos
retirado do debate ideológico.
Discutir política não é mais uma
opção: o Estado já está dentro da sua casa. Por exemplo: Caso você ache que
seus filhos não devam estudar no nosso sistema tradicional de ensino, saiba que
você não tem mais essa escolha. A frequência escolar é obrigatória. E será
nessa mesma escola, a qual o seu filho é obrigado a frequentar, que lhe será
ensinado que meninos e meninas são meras quimeras sociais, e nós somos os
algozes deles.
Enquanto quisermos nos ausentar do
debate, e não aceitarmos discutir conceitos como liberdade, tamanho do Estado e
autonomia, irão decidir por nós, à revelia.
Há de se retomar a análise dos fatos
e discussões sobre as possibilidades que o mundo oferece. Quais valores devem
pautar a vida em sociedade? Não se trata de um problema de fácil resolução,
pois a própria filosofia encontra-se em evolução constante. Todavia, embora ainda
estejamos evoluindo no processo civilizatório, algumas verdades já existem,
como as diferenças entre homens e mulheres. Já é claro que não cabe a um único
governante, ou grupo, determinar que seu filho é “unissex”, a partir de teorias
falhas, que talvez sirvam a algum outro interesse.
A nova matriz social, carente de lógica, tem
que ser questionada, revista e modificada.
Devemos defender a possibilidade de
expressão individual (também chamada de liberdade), cessar o patrulhamento
social e parar de adjetivar as pessoas em discussões ideológicas. Temos que
discutir os fatos, não as pessoas. As pessoas deixaram de lado a capacidade de
análise dos fatos, mesmo as mais esclarecidas. Não se discute mais qual é o
melhor sistema, pois toda conversa acaba se desvirtuando para a discussão da
vida dos interlocutores, ou do cenário político, em detrimento da discussão teórica.
Em qualquer conversa, o foco deve ser na discussão das idéias, e não na vida
particular dos interlocutores. As pessoas devem aprender a se defender da
personalização da discussão (do tipo argumentum
ad hominem), e se ater à análise dos fatos e da situação.
Dentro dessa retomada da lógica, ninguém
poderia admitir um argumento, em que qualquer grupo se posicionasse como
defensor da igualdade e da liberdade, ao mesmo tempo!
Ideologicamente, um conceito exclui o
outro.
Irei exemplificar tomando por base a
ideologia de gênero: conforme exposto acima, quem defende a igualdade, defende
a ideia de que os seres humanos nascem iguais, bons e puros, mas a sociedade os
corrompe. Segundo essa perspectiva, os seres humanos nascem tão iguais,
que nem mesmo existem diferenças de gênero: sexo masculino e sexo feminino
seriam invenções sociais, apesar das inúmeras provas científicas (e
observacionais) ao contrário. Os seres humanos nasceriam "unissex",
com uma pequeníssima diferença anatômica. Bastaria, portanto, criá-los de forma
"unissex", e depois "deixá-los escolherem seu sexo". Exceto
por alguns artistas, ou raras exceções (que fogem ao escopo desse texto, exceto
pela exceção que confirma a regra), a identificação com o próprio gênero (e não
me refiro aqui à orientação sexual) continua a ocorrer, em larga escala, apesar
da ideologia de gênero. Caso essa ideologia estivesse correta, já estaríamos
vendo milhares, milhões de seres misóginos (metade homem, metade mulher), o que
também não ocorreu. A determinação biológica de gênero é inequívoca. O que tem
ocorrido são mulheres e homens perdidos em qual rumo seguir, pois não conseguem
se orientar nem em relação ao próprio sexo.
Cientistas sérios não defendem a
ideia de caracteres adquiridos de Lamarck, sendo que a genética contemporânea
já deixou claro que Darwin tinha razão. A negação da heritabilidade biológica
das características humanas acabou proporcionando sofrimento e mortes
desnecessárias.
É inútil impor ao ser humano
características que não são suas. Mulher é mulher. Homem é homem. A espécie não
muda segundo o interesse ideológico de
ninguém, nem de nenhum sistema. As crianças continuam se tornando homens, ou
mulheres, na idade adulta. Por que não deixamos que elas cresçam, e nos
resguardamos a observar e aceitar suas tendências e evolução natural?
Mas não seria isso o que a ideologia
de gênero defende?
Não.
O que está sendo defendido é a
imposição de um tratamento unissex, sem respeitar os interesses naturais das
próprias crianças, ou dos responsáveis por elas, os seus pais.
Uma outra observação remete à escolha
das meninas como padrão ideal para a infância. Por que não poderiam ter sido
escolhidos os meninos? Não teriam, mulheres e homens, meninas e meninos, o
mesmo valor? Por que somente o comportamento contido, sem a energia cinética
clássica dos meninos é valorizado? Posto que essas diferenças de gênero seriam
somente sociais, por que não se tomou como padrão ideal o comportamento mais
despachado dos meninos? Ou então, por que não se assumiu os dois padrões como
adequados?
A confusão criada não está sendo
solucionada pela ideologia de gênero. Está sendo criada por ela
.
.
O mesmo ocorre com todas as outras
ideologias que o politicamente correto nos impôs.
Estamos permitindo e incentivando a
hipertrofia do poder central, com o Estado funcionando como o árbitro, e, pior ainda, como ator social,
determinando como você deve, ou não deve, educar o seu filho. O Estado não
deveria ter o poder de determinar a qual sexo pertence o seu filho ou sua filha.
E, caso o cidadão não aceite a
imposição estatal, medidas jurídicas poderão ser tomadas. Para se impor a (suposta)
igualdade, restringe-se a liberdade. Um único poder central, determinando
os valores a serem adotados, sob pena de sanções jurídicas, não me parece um
governo humanitário.
Percebe-se, portanto, que estamos
diante de uma clara confusão ideológica. Afinal, qual opção é válida, no
sentido de uma real possibilidade, e não uma mera distorção perceptiva?
a) Liberdade e Igualdade;
OU
b) Liberdade versus Igualdade.
Embora seja altamente desejável, não
é possível ter os dois.
O apelo social à igualdade e à "
justiça social " se tornou um discurso de difícil contraposição. De alguma
forma, talvez pela repetição incessante, esses conceitos foram associados, ao
mesmo tempo, a determinados grupos, ferindo completamente a lógica. Temos agora
que enfrentar esse equívoco perceptivo e ideológico, pois, para termos a
suposta " justiça social " , é necessária a intervenção estatal. São,
portanto, conceitos mutuamente excludentes. Fica claro que a gerência (ou
ingerência) do Estado nas relações interpessoais acaba por restringir as
liberdades individuais.
Ainda podemos ter pensamentos
dissonantes! Ainda podemos expressá-los! Utilizemos essa prerrogativa!
Entretanto, caso você não goste de
política, e não queira se envolver em discussões dessa natureza, saiba que o
Estado, possuidor de todo o saber, fará as suas próximas escolhas por você. Afinal,
ele já fez tantas, por que não continuar assim?
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